domingo, 6 de julho de 2014

TRÊS OLHARES SOBRE "FORREST GUMP - O CONTADOR DE HISTÓRIAS"


            Como foi dito no meu texto de estreia deste blog, desde criança eu sempre gostei muito de inventar histórias. As histórias que eu criava quando era criança quase sempre misturavam muita aventura com um pouco de comédia e seguiam mais ou menos o mesmo estilo dos desenhos animados e filmes infanto-juvenis que eu assistia na época. Apesar disso (ou seria justamente por isso?), durante grande parte da minha infância o meu filme favorito foi Forrest Gump - O contador de histórias (1994), longa-metragem dirigido por Robert Zemeckis e estrelado por Tom Hanks, que não contava exatamente uma história infantil de aventura, mas que me tocou profundamente na época.

Tom Hanks, o eterno Forrest Gump
            Eu vi Forrest Gump... três vezes até hoje (acho que em breve assistirei pela 4ª vez) e uma das coisas que mais me chamaram a atenção no filme, além do ótimo roteiro, das excelentes atuações e das imagens impactantes, foi a mudança na forma como eu vi o filme em cada uma dessas ocasiões (por isso estou em dúvida se assisto ao filme logo ou se resisto à tentação e deixo para vê-lo daqui a alguns anos). A primeira vez que assisti à Forrest Gump... foi em casa, com os meus pais, quando o filme passou pela primeira vez na TV Globo em uma sessão noturna de filmes (provavelmente na Tela Quente, no dia 29/12/1997, de acordo com esse site). Eu lembro de ter gostado muito do filme (meus pais não gostam muito de filmes e não prestaram atenção em toda a história, mas a minha mãe pareceu ter gostado de algumas cenas), que, na minha visão de menino de nove anos de idade, contava a história de um sujeito legal e meio bobão que passava por uma série de situações inusitadas (quase é recusado pelo diretor da escola por ter um QI abaixo da média, sofre bullying na infância por conta de um aparelhos estranho que usa nas pernas, se torna jogador de futebol americano, testemunha o escândalo do Watergate, vai para a Guerra do Vietnã, participa dos jogos olímpicos como jogador de pingue-pongue, conhece importantes músicos e políticos etc), mas não cheguei a ter uma percepção muito ampla de todos os sentimentos e do impacto das experiências vividas por Forrest Gump por ter pouca maturidade (e conhecimento de história) para isso.

            A segunda vez que vi Forrest Gump... foi bem mais marcante, pois eu já era mais velho (acho que eu tinha uns 12 anos de idade) e tinha um pouco mais de maturidade para entender alguns elementos da trama que não poderiam ser compreendidos por uma criança comum de 9 anos de idade. Além disso, eu estava vendo o filme com uma prima que tinha a mesma idade que eu e pudemos trocar opiniões sobre o filme. Nessa vez, eu lembro que Forrest Gump... foi exibido na Sessão de Sábado e que eu e minha prima havíamos perdido os primeiros minutos do filme, porém como eu me lembrava bastante do início da história e nós tínhamos à disposição a sinopse do filme publicada no guia de TV do jornal, isso não prejudicou o entendimento do filme. Dessa vez, eu entendi um pouco melhor os sentimentos de amizade (estava assistindo ao filme com uma prima que era a minha melhor amiga na época), amor (já tinha me apaixonado algumas vezes), discriminação (já havia passado pela experiência de ser considerado um "estranho" por todos), de perda (um primo de apenas 15 anos havia cometido suicídio) e de impotência diante das circunstâncias da vida, e Forrest Gump se tornou uma espécie de herói pessoal para mim, que nunca fui um grande fã do Batman, do Homem-Aranha e do Super-Homem (embora acompanhasse os filmes, séries e desenhos desses super-heróis na época). Entretanto, ainda havia alguns resquícios de infantilidade na visão que eu tinha do filme, pois eu lembro que eu e minha prima discutimos durante alguns minutos se o gênero do filme era drama, como constava no guia de TV do jornal, ou se era aventura.

 
Tenente Dan Taylor (Gary Sinise) e as pernas da discórdia
          
Eu defendia que Forrest Gump... deveria ser considerado como um filme de aventura porque o filme mostrava várias histórias malucas que o personagem viveu, algumas cenas cômicas e alguns personagens lembravam estereótipos meio comuns de filmes de aventura voltados para o público infanto-juvenil, como o tenente durão, a menininha bonitinha e meiga, a mãe conselheira e carinhosa e até mesmo o protagonista estilo "loser" que consegue triunfar após uma longa e tortuosa trajetória. A minha prima, por sua vez, defendia que o filme realmente era um drama, pois personagens importantes morriam (não vou citá-los para não dar spoilers, caso você não tenha visto o filme), o tenente Dan perde as pernas durante a guerra e havia vários outros elementos dramáticos do filme. Eu acabei concordando com ela, mesmo não achando o filme tão dramático assim. Outro confronto de ideias que tivemos, dessa vez com argumentos mais na área do palpite do que com base em informações do filme e, por esse motivo, um pouco mais engraçado, era sobre o ator que interpretava o personagem tenente Dan: afinal de contas, os produtores do filme contrataram um ator que tinha pernas e as camuflaram para fazer as cenas após a amputação, ou eles contrataram um ator que não tinha as pernas e colocaram próteses nas cenas do personagem antes da amputação? Eu achava que o tenente Dan Taylor (Gary Sinise) tinha pernas e que eles fizeram algum truque para escondê-las; mas a minha prima insistia que era impossível esconder as pernas do ator em todas aquelas cenas e achava que eles tinham contratado um ator que usava próteses para interpretar o personagem. Como na época não tínhamos computador, internet e Google à disposição (éramos de classe média baixa e estávamos no ano 2000, ou seja, computador era um artigo de luxo para famílias como as nossas), ficamos cada um com seus "achismos" e sem saber quem estava certo.

"A árvore dos sonhos" (1994), com Kevin Costner e Elijah Wood
            Depois disso, eu fiquei vários anos sem rever Forrest Gump... e, nesse meio-tempo, acabei vendo outros filmes bons (pelo menos foi o que eu achei na época) que tiraram temporariamente Forrest Gump... do topo da minha lista de filmes favoritos (esses filmes eram A árvore dos sonhos, Os sete suspeitos e Il ciclone - Amor e Paixão, todos filmes meio "lado B" que não chegam as pés de Forrest Gump - O contador de histórias). Não preciso dizer que, após uma revisão desses filmes, parte do encanto que eles exerceram sobre mim se desfez e hoje em dia eu teria até um pouco de constrangimento de recomendá-los a alguém (hum... A árvore dos sonhos tem suas qualidades e alguns elementos do filme lembram um pouco Forrest Gump..., mas Os sete suspeitos é um filme bastante datado e Il ciclone - Amor e Paixão tem um ar cafona e um humor que, por vezes, acaba sendo bastante forçado). Com isso, me veio a vontade de rever Forrest Gump... pra conferir se, ao contrário desses três filmes, ele conseguiria me encantar do mesmo jeito que me encantou na infância e na pré-adolescência.

            No ano passado, durante uma viagem para Curitiba onde fui assistir a um show do Matchbox Twenty (minha banda favorita há vários anos e que não tenho constrangimento algum em recomendá-la a alguém), fiquei com vontade de comprar algum CD ou DVD da banda para levar de lembrança da viagem e fui a várias lojas. Não encontrei nada do Matchbox Twenty em nenhuma das lojas visitadas, mas encontrei  ̶  adivinhe só  ̶  uma edição especial do filme Forrest Gump - O contador de histórias à venda. O kit vinha com dois DVDs, um com o filme e outro com vários extras (testes com alguns atores, bastidores do filme, depoimentos da equipe técnica e de atores etc) e fiquei com muita vontade de ver o filme assim que chegasse de viagem, mas tive vários compromissos pessoais que me ocuparam os dois primeiros dias (contar pra toda a família como foi a viagem foi o principal deles) e me fariam ter que adiar a revisão do filme em uma semana, pois já era domingo de noite e eu teria a semana seguinte ocupada com a volta ao trabalho e à faculdade. No domingo à noite, hora em que eu já deveria estar indo dormir para acordar cedo no dia seguinte, eu não resisti e quis dar uma olhadinha no filme, nem que fosse só pra ver os primeiros 15 minutinhos. Acabei vendo os primeiros 15 minutos, os outros 127 e mais alguns extras.

            Nessa terceira vez que assisti à Forrest Gump - O contador de histórias, o meu encanto não se manteve o mesmo das outras duas vezes: ele se renovou. Eu vi outro filme, com diálogos muito mais profundos e intensos (vi o filme em versão legendada, com a voz dos atores originais ao invés dos dubladores, o que só ressaltou o enorme talento de Tom Hanks, Robin Wright, Sally Field, Gary Sinise e de todo o elenco), com uma trama muito criativa, inteligente e bem entrelaçada (agora já sabia o que era Watergate e Apple) e com uma história que tinha outro sentido para mim. Pela primeira vez eu chorei vendo Forrest Gump... (eu raramente choro vendo filmes) e constatei que, apesar de algumas cenas engraçadas, do tom tragicômico do protagonista e das grandes aventuras vividas por ele, a minha prima tinha razão e Forrest Gump... é, na sua essência, um filme dramático, mas com um pouco de humor e aventura. Mais ou menos como é a vida de quase todo mundo.

Eis o segredo do sumiço das pernas
            Quanto à discussão sobre as pernas do Gary Sinise, aí quem tinha razão era eu. O ator realmente tinha pernas e as cenas nas quais ele aparecia sem elas foram feitas graças a um excelente truque no qual as pernas dele era cobertas com meias azuis e removidas digitalmente. Nas várias cenas nas quais os cotocos do personagem passavam perto de objetos como mesas e camas, eram feitas duas filmagens: uma com o ator passando com suas pernas no local onde estaria o objeto (sem o objeto em cena ou com parte dele removida) e outra do cenário sem o ator, mas com o objeto no local. Então as imagens eram sobrepostas e, assim, foram construídas as ótimas cenas do tenente Dan sem as pernas.


Forrest Gump (Tom Hanks), tenente Dan (Gary Sinise) e Bubba (Mykelti Williamson) - No filme e 20 anos depois 
            Hoje, Forrest Gump - O contador de histórias completou 20 anos de lançamento e continua sendo visto e revisto por fãs do mundo inteiro. Para quem, assim como eu, viu Forrest Gump - O contador de histórias várias vezes em diferentes momentos da vida, tenho certeza de que em cada uma dessas vezes o filme teve um significado diferente. O filme foi indicado ao Oscar de 1995 em 13 categorias e saiu vitorioso em seis: Melhor Filme, Melhor Direção, Melhor Ator para Tom Hanks, Melhor Roteiro Adaptado (o filme é baseado em um livro de 1985 chamado Forrest Gump, mas o livro, pelas sinopses e comentários que eu li na internet, parece ser muito inferior ao filme), Melhor Edição e Melhores Efeitos Visuais. Além disso, faturou três Globos de Ouro e dezenas de outros prêmios importantes; mas a maior honraria de todas, sem sombra de dúvida, foi a de ter se tornado um filme inesquecível.


-------


Qual é o seu filme favorito? Tem algum filme que, a cada vez que você assiste, ele parecer ter um significado novo pra você? Você já viu Forrest Gump - O contador de histórias? O que achou do filme? Sinta-se à vontade para responder nos comentários.


Abraços!

Um comentário:

  1. Uma bela crítica. Aliás, a trama desse filme é incrível (vamos ser sinceros). O fato de relacionarem perfeitamente a história de um homem ingênuo, humilde, corajoso, amigo, etc. que "cruza" com vários fatos que marcaram a história dos Estados Unidos é extremamente inovador. O retrato de como a vida pode nos surpreender, com situações inesperadas (+/-), e que cabe a nós lidarmos com elas é fantástico. Sem duvidas o filme é sensacional. Parabéns pelo seu texto.

    ResponderExcluir